5 de jan. de 2012

ESSA É DELE !!!!



Todos deviam ser donos do seu nariz mas infelizmente isto não acontece. No Brasil o sonho do nariz próprio continua inalcançável para a maioria. Só uma minoria privilegiada é dona do seu nariz. Poucos sabem que 70% dos brasileiros alugam seu nariz. O Governo vem tentando melhorar a situação através dos financiamentos da CEF para a aquisição do nariz próprio, mas com a correção monetária, reajustes, etc. o pobre acaba pagando pelo nariz muito mais do que pode.

Muitos vivem na ilusão de serem donos do seu nariz e na realidade não são. Mesmo os proprietários de nariz não têm direitos absolutos sobre ele. O nariz é um bem móvel. Qualquer transação envolvendo o nariz depende da fiscalização pública. Você descobre que o nariz não lhe pertence quando, por exemplo, pretende viajar para o exterior. Não há nenhum empecilho para você sair do país, ao contrário do que se pensa:

- O senhor tem completa liberdade de ir e vir.

- Sem papelada, sem nada? Posso sair quando quiser?

- Exato. Mas sem o nariz, é claro.

- Como? Eu sou dono do meu nariz.

- Perdão. Seu nariz é uma concessão do Governo. Pertence ao Estado.

- Mas eu não posso viajar sem ele. Somos muito ligados.

- Bem. Para tirar um nariz do país é preciso passaporte, visto de saída, atestado de bons antecedentes, atestado de ideologia do nariz… E o depósito compulsório.

- Quanto?

- Os olhos da cara.

Todos os impostos e taxas que você paga ao Governo são pelo uso do nariz. O nariz, na verdade, é a única parte da sua anatomia sobre a qual o Governo tem todo o poder. O Estado não interfere no resto do seu corpo que, no caso de prisão arbitrária, só vai junto porque quer. Foi isso, na opinião de alguns juristas, que tornou o habeas-corpus supérfluo entre nós. E, convenhamos, um haveas-nasalus seria ridículo.

Eu alugo o meu nariz e estou muito satisfeito com ele. Não conheço o proprietário. Pago o aluguel em dia, conservo o nariz em bom estado e não dou ao locador qualquer razão para queixa. Mas, teoricamente, o dono do meu nariz pode reclamá-lo quando quiser. Basta uma denúncia vazia de que eu estou metendo o meu (ou dele, no caso) nariz onde não devo e ele pode reaver o nariz. A situação é irrespirável.

Alguns proprietários de narizes alugados estão sempre vistoriando a sua propriedade. Acordam o locatário no meio da noite para ver como vai o nariz.

- Hum. Deixa ver. Parece bem. Este cravo aqui do lado…

- Vou espremer amanhã mesmo.

- Você limpa todos os dias?

- Por dentro e por fora.

- Olha aí; os óculos estão deixando marca. Não pode.

- Vou cuidar disto. Agora posso durmir? Estou meio resfriado…

- Que tipo de lenço você tem usado? De papel, espero. lenço de pano irrita o nariz. Olhe lá, heim?

Alguns contratos de aluguel são extorsivos. Incluem uma cobrança por espirro, taxa-coriza, etc.

Existe uma espécie de bolsa do nariz onde os grandes proprietários compram, vendem e trocam seus narizes.

- Tenho um nariz bem grande em Petrópolis. Troco por dois pequenos na Zona Sul.

- Nariz novo. Vendo. Estilo grego.

- Compro um afilado. Qualquer zona menos Avenida Farrapos.

- Vendo um achatado, simpático, amplas narinas, na Independência.

- Reformado, como novo, troco por adunco ou arrebitado.

A questão do nariz reformado é, legalmente, um pouco confusa. Quem é dono do seu nariz pode alterá-lo como quiser, desde que obtenha uma licença da Prefeitura. Um bom Pitanguy, hoje, vale uma fortuna. Mas quem aluga o seu nariz e quer modificá-lo deve antes consultar o dono.

- Estou pensando em tirar um pouco aqui, estreitar aqui e baixar aqui.

- Impossível. Não posso permitir. A senhora quer diminuir a área total do meu nariz.

- Mas vai ficar um Tônia Carrero perfeito. Vai aumentar de valor.

- Sei não… Aumentam os impostos…

- O senhor pode aumentar o aluguel.

- Feito.

Os donos do seu nariz têm o poder e não há nada que você possa fazer a respeito. O seu nariz pode ter sido vendido a uma multinacional agora mesmo e você nem sabe.

Luís Fernando Veríssimo