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"Dizem que ofendo as pessoas. É um erro. Trato as pessoas como adultas. Critico-as. É tão incumum isso na nossa imprensa que as pessoas acham que é ofensa. Crítica não é raiva. É crítica. Às vezes é estúpida. O leitor que julgue. Acho que quem ofende os outros é o jornalismo em cima do muro, que não quer contestar coisa alguma. Meu tom às vezes é sarcástico. Pode ser desagradável. Mas é, insisto, uma forma de respeito, ou, até, se quiserem, a irritação do amante rejeitado."
PAULO FRANCIS
PAJÉ CONTRA PAJÉ No dia 25 de junho de 1983, Paulo Francis publicou na Ilustrada um texto intitulado "Caetano, pajé doce e maltrapilho". Era uma referência ao compositor baiano, que havia participado de uma entrevista com Mick Jagger no programa "Conexão Internacional", da Rede Manchete, conduzido pelo jornalista Roberto D'Ávila, com a participação de Walter Salles atrás das câmeras (ele ainda não se tornara o famoso cineasta de "Central do Brasil").
D'Ávila convidara Caetano para participar da conversa com o líder dos Rolling Stones. O autor de "Tropicália" era visto por muitos como uma versão brasileira dos grandes astros pop internacionais dos anos 60, com a vantagem de ser também considerado um artista-intelectual.
Para Francis, no entanto, esse status parecia problemático. O colunista elogiava Caetano, considerava-o até melhor do que Jagger como compositor, mas criticava o fato de ele falar "de Pajé contra pajé tudo com autoridade imediatamente consagrada pela imprensa, que é mais deslumbrada do que o público". Para ele, transformado em "totem", Caetano teria se apequenado diante de Jagger no "Conexão Internacional": "É evidente, por exemplo, que Mick Jagger zombou várias vezes de Caetano na entrevista na TV Manchete. O pior momento foi aquele em que Caetano disse que Jagger era tolerante e Jagger disse que era tolerante com latino-americanos (sic), uma humilhação docemente engolida pelo nosso representante no vídeo".
O colunista também fez reparos a uma pergunta feita por Caetano a Jagger sobre o lugar do rock na história da música. "Essa pergunta simplesmente não se faz em televisão, ou até em jornal. É de um amadorismo total. Só serve para seminários de 'comunicação' no interior da Bahia. Não é uma pergunta jornalística. Jagger começou a debochar aí."
O artigo não provocou uma resposta imediata de Caetano. Ele não enviou ao jornal um artigo, como se poderia supor. Mas, aqui e ali, em entrevistas, foi falando do assunto. Convidado a manifestar-se sobre o caso na coletiva para o show "Uns", em São Paulo, em outubro de 1983, chamou o jornalista de "bicha amarga".
Francis retrucou em sua coluna: "Duas sorridentes cascavéis deste caderno me comunicaram hoje que Caetano Veloso me agrediu numa coletiva. Outro tema de debate: cantor de samba fazendo show vale uma coletiva? Por quê? Bem, fiz críticas culturais ao estilo de personalidade de Caetano, o flagelado milionário de 'boutique', servil como um escravo diante do condescendente Mick Jagger. São críticas, certas ou não, mas culturais. Qual é a resposta de Caetano? Diz que sou uma bicha amarga e recalcada. É puro Brasil. Ao argumento crítico, o insulto pessoal. Mas o insulto é o próprio Caetano. Afinal, o que ele quer dizer é que sexualmente sou igual a ele, e usa isso como insulto."
A temperatura esquentou e a Ilustrada fez uma enquete sobre quem faria a cabeça dos intelectuais e descolados da época. Francis ou Caetano? O caderno ouviu de José Guilherme Merquior a Casagrande, passando por Henfil e José Arthur Giannotti. Curiosamente, Caio Túlio Costa, que ainda não era ombudsman, mas secretário de Redação da Folha, ficou com Francis. Mais tarde, ele também teria um entrevero com Caetano, ao criticar o filme "Cinema Falado" (1986), lançado pelo compositor.
APROVEITEM!
BEIJOKAS SURTADAS,
REGINA